A história do pássaro caído

A minha mãe sendo uma grande mestra de educação dos seus filhos, gostava muito de nos contar histórias, mas daquelas que nos marcavam de tal forma que ainda hoje me lembro de muitas. Esta técnica de criar e educar os filhos tem vindo a cair em desuso e poucos pais hoje conversam com os seus filhos e muito menos ainda, lhes contam histórias. Creio que esta técnica virá novamente ao de cima, pois as crianças têm muita necessidade de conversação e comunicação como forma de aprendizagem para a vida.

Venho contar uma dessas histórias, a história do pássaro caído, lembro-me que começava assim:

No caminho para a vila, o lugar onde as pessoas vinham tratar dos seus assuntos e fazer algumas compras, pois a maior parte delas eram feitas à porta de casa, passavam por lá os “pitrolinos” com as mercearias, os “galinheiros” com as galinhas, os ovos e até panos de fazenda e ainda os “azeiteiros” que trocavam azeitona por azeite. Nesse caminho existia mais ou menos a meio uma pequena árvore na qual os pássaros vinham fazer o seu ninho.

Nesse ano uma fêmea chocava sete “seixinhos”, nome que se dava aos ovos dos pássaros, de todos eles, um a um, iam saindo os passarinhos e todos seguiram seu rumo excepto um, precisamente o último a romper de dentro do seu ovo.

Quando começou a voar, já seus irmãos pássaros voavam outros vôos mais altos, então sua mãe lhe ensinou tudo o que seria necessário para também realizar seus vôos. Durante muito tempo a mãe do passarinho o acompanhou até que ela um dia partiu e o filhote foi obrigado a seguir seu rumo sem mais ajuda.

O pássaro acabou de crescer mas sempre voava sozinho, pois os vôos dos outros pássaros normalmente seguiam por caminhos diferentes do dele, mas tornou-se um pássaro bem conhecido pelas acrobacias que tão bem sabia fazer em pleno vôo. Era um pássaro muito respeitado pelos outros que o olhavam bem de frente quando por ele passavam e chilreavam sons de admiração.

No auge da sua força, já adulto, num daqueles Invernos bem rigorosos, muitos dos outros pássaros estavam já recolhidos prevenindo-se de uma tempestade de vento e chuva que se avistava lá bem ao longe, mas que ele não tomou conta, tal era o entusiasmo com que se deliciava nos vôos que estava realizando.

De frente com o mau tempo, o pássaro foi repelido para o meio de um campo de pinheiros que havia ali por perto e embateu contra muitos deles. Os trancos e as fagulhas que andavam pelo ar não lhe davam a possibilidade de ele ajeitar por ali um lugar seguro para se resguardar e sem forças, caiu moribundo pelo chão.

Não sabendo bem como recuperar, nunca perdeu a esperança de continuar a voar e já num dos dias de bonança que se seguem às tempestades, aquele pássaro começou a saltitar pelo chão dando pequenos vôos. Os outros pássaros, lá de cima fitavam-no fixamente e chilreavam sons estridentes, tentando provocá-lo para ele desistir da sua recuperação. Nem sequer uma vez desceram mais perto para verificarem o estado em que estava o pássaro caído e se tinha necessidade de ajuda para voltar a voar.

Apesar de tanta arrogância, aquele pássaro não desistiu nem por um só momento e passado algum tempo começou a voar alto e a fazer as suas acrobacias no ar ainda melhor do que aquelas que antes fazia, pois enquanto esteve caído, foi treinando a sua perícia e aperfeiçoando as suas técnicas de vôo.

O pássaro caído, por todo o seu trabalho desenvolvido, retornou aos altos vôos, não só foi aceite pelos restantes, mas conseguiu também, por essa via, voar por caminhos nunca antes percorridos, escolhendo ele novos rumos, pelos quais foi seguido pelos outros da sua espécie.

Esta é uma história muito bonita contada há várias décadas mas cuja moral faz cada vez mais sentido.

Carlos Brito